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A Fotografia Esportiva e o Momento Decisivo

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Ari Gomes, um renomado fotógrafo esportivo, disse certa vez em uma entrevista, que é em um evento esportivo que o profissional necessita avaliar ao mesmo tempo todos os aspectos que envolvem velocidade, profundidade de campo, luz e lentes. Quando se fotografa qualquer esporte, seja futebol, basquete ou vôlei, a ação acontece de maneira rápida e imprevisível: em um instante, um lance de disputa de bola pode estar acontecendo a metros de distância da objetiva do profissional e em um piscar de olhos a bola atravessa o campo de jogo e qualquer jogador pode fazer um gol decisivo, uma cortada ou uma cesta da vitória. Esportes proporcionam várias imagens de impacto e lances inusitados que geram grandes fotografias, no entanto, os momentos mais importantes são justamente esses decisivos, que definem o resultado de um jogo ou o influenciam diretamente.


Quando o fotógrafo francês Henry Cartier-Bresson formulou a sua filosofia do “momento decisivo”, com certeza, ele não se referia aos esportes ou até mesmo a alguma situação específica; mesmo porque, não há registro de qualquer fotografia esportiva de autoria atribuída a Bresson em toda a sua vida. No entanto, a sua filosofia se encaixa perfeitamente na temática esportiva, mesmo que às avessas, já que esta teoria não foi idealizada para a fotografia esportiva. Esportes são eventos únicos, cada modalidade tem suas particularidades mas, em geral, eles são disputados de maneira rápida e emocionante.


Em qualquer esporte está em jogo, ganhar ou perder, sofrer e sorrir são estes momentos singulares e decisivos que não ocorrem com frequência no cotidiano da maioria das pessoas. Para capturar esses momentos, o fotógrafo deve estar muito atento a todos estes acontecimentos, pois a qualquer momento uma imagem de extremo valor surge à lente do profissional. Neste artigo analisaremos justamente o conceito de momento decisivo e sua relação com a fotografia esportiva. Antes, no entanto, se faz necessária uma breve retomada na história da fotografia para melhor compreensão das relações aqui propostas.


Desde sua criação no século XIX a fotografia evoluiu consideravelmente em todos os aspectos. Porém durante esse período, podemos apontar dois principais momentos de avanço no campo da foto. O primeiro é quando se começam a produzir as primeiras câmeras com controle de velocidade, permitindo os fotógrafos a registrarem imagens em movimento.

Para o fotojornalismo, a conquista do movimento revelou-se de importância vital, uma vez que permitiu “congelar” a ação, imprimi-la numa imagem quase em tempo real, capturar o imprevisto, chegar ao instantâneo e, com ele, acenar com a idéia de verdade: o que é assim capturado seria verdadeiro; a imagem não mentiria [...] (SOUSA, 2000, p.30)

Aliado a isso também se destaca o desenvolvimento das lentes e materiais usados na fabricação. Neste âmbito podemos destacar a Leica, uma máquina de pequeno formato e extrema qualidade, que acabou se tornando a mais usada entre profissionais da época, entre eles, Henry Cartier-Bresson. Com esse avanço no equipamento foi possível fotografar temas diferentes aos comumente retratados, entre esses assuntos estão os eventos esportivos, que antes eram registrados na forma de retratos ou encenações, onde o profissional recriava uma cena importante da partida com os jogadores envolvidos ou efetuava um retrato do principal atleta do confronto.


O segundo momento crucial na evolução da fotografia se dá com o surgimento da tecnologia digital. Os primeiros protótipos e experimentos surgiram no início dos anos 80, com câmeras muito pesadas e baixíssima qualidade de imagem. Foi somente nos anos 90 que essa tecnologia chegou de fato às mãos de amadores e profissionais. No fotojornalismo a máquina digital começou a ser testada na Copa do Mundo de Futebol do Estados Unidos de 1994, mas o formato diferente do corpo de câmera e as dificuldades em se transmitir os fotogramas, resultou em seu pouco uso. Foi em outro grande evento esportivo que esta tecnologia começou a chamar a atenção dos profissionais, nas olimpíadas de Atlanta, em1996, vários fotógrafos utilizaram o equipamento. As facilidades e vantagens apresentadas pela fotografia digital acabaram por substituir todo sistema analógico, isso propiciou um novo tipo de fluxo no ato fotográfico, o profissional não precisava mais se preocupar em trocar o filme ou avançá-lo para a próxima exposição, tudo acontecia automaticamente e digitalmente.


A era digital na fotografia com certeza serviu para facilitar a vida dos profissionais e amadores. Porém a revolução aconteceu apenas no aspecto técnico e maquinista da esfera fotográfica: quem recorta a imagem no espaço de tempo ainda é quem opera a câmera. O ato fotográfico é faculdade única e exclusivamente do fotógrafo, é ele quem aperta o botão e decide quando tirar a foto. E foi justamente na primeira grande evolução citada anteriormente que o papel do fotógrafo ganhou maior destaque, a fotografia estava mudando sua maneira de retratar os temas cotidianos. Com o advento das câmeras de pequenos formatos e com objetivas permutáveis, foi proporcionada ao fotógrafo uma gama de possibilidades de enquadramento, com posição de luz e velocidade. Com estes novos adventos, alguns conceitos antigos da fotografia foram caindo, como o de realizar fotografias de um evento com as pessoas imóveis para não se borrar a foto, a imagem deixava de ser apenas um registro e ganhava potencialidade narrativa. Aos poucos uma nova maneira de abordar os temas começou a ser realizada pelos fotógrafos. Este novo período foi denominado de fotojornalismo moderno, ou “fotojornalismo do instante”, conceito que mais tarde foi definido por Cartier-Bresson como “momento decisivo”. Além de Bresson, esse período revelou muitos fotógrafos icônicos neste ramo, como Robert Capa, Martin Munckasi, Waker Evans, entre outros.


Inserido neste momento histórico de euforia pela fotografia, o francês HenryCartier-Bresson inspirado por uma fotografia de Munckasi começou a dar seus primeiros cliques. Bresson sempre foi amante das artes, gostava de pintar e desenhar, mas foi na fotografia que encontrou a maneira ideal para retratar o mundo, tinha “o desejo de capturar numa só imagem o essencial de uma cena que surgisse” (BRESSON, 1996, p.16). Foi no início dos anos 30 que ele comprou sua primeira Leica, equipamento que o iria acompanhar em toda sua trajetória: “ela se tornou o prolongamento do meu olho e não me deixa mais” (BRESSON, 1996, p.16). Com sua câmera de pequeno formato na mão, Bresson viajou pelo mundo atrás de imagens, trabalhou para as mais importantes revistas da época e realizou inúmeras reportagens fotográficas.


Bresson sempre se preocupou com o processo fotográfico para chegar ao momento decisivo de uma cena. Para ele, na maioria das vezes o fotógrafo deve passar despercebido, a abordagem deve ser feita a passos de lobo, aproximar-se sigilosamente como um gato e ter o olhar agudo, pois qualquer movimento brusco pode colocar a fotografia em risco: [...] um fotógrafo impaciente ou simplesmente apressado se cobre de ridículo, o que é irremediável. Se um dia ficou com pressa, e alguém o notou com sua máquina, só resta esquecer a fotografia, e deixar as crianças se aglutinarem às suas pernas (BRESSON, 1996, p.20).

Outra grande preocupação de Bresson era com a composição dos elementos na foto: Deve-se situar a máquina fotográfica no espaço em relação ao objeto, e começa aí o grande domínio da composição. A fotografia é para mim o reconhecimento da realidade de um ritmo de superfícies, de linhas ou de valores; o olho recorta o objeto e o aparelho só tem de fazer seu trabalho: imprimir a decisão do olho na película (BRESSON, 1996, p.24).

Esta preocupação com todo o processo fotográfico pode ser muito bem percebida nas fotografias de Bresson. Em quase todas as imagens existe uma composição geometricamente perfeita, onde todos os elementos se encaixam em um momento único e decisivo. Podemos citar como exemplo a fotografia célebre de um homem pulando uma poça d'água na estação de trem de Saint-Lazare (foto 01), ou a imagem de uma bicicleta passando sob um lance de escadas (foto 02). Nestes dois exemplos podemos perceber a simplicidade e eficiência na composição dos elementos impressos nas fotografias.



Contudo, no que consiste o “momento decisivo” tão difundido de Bresson? A filosofia do momento decisivo pode ser resumida naquele instante único, onde toda a essência de um acontecimento se forma completamente diante da máquina. Fotografar é num mesmo instante e em uma fração de segundo reconhecer um fato e a organização rigorosa das formas percebidas visualmente que exprimem e significam este fato. No decorrer da ação existe um momento em que os elementos em movimento entram em equilíbrio. A fotografia deve se aproveitar desta ocasião e eternizar tal instante (BRESSON,2009, p.4). Porém, Bresson aponta que para capturar o instante decisivo é necessário todo um processo fotográfico que culmina no aperto do disparador e a captura do momento. É justamente sobre esta ação que Dubois (1994) destaca:


Antes: o fotógrafo decide em primeiro lugar fotografar (isso já não ocorre por si),depois escolhe seu sujeito, o tipo de aparelho, o filme, procura sua melhor lente,determina o tempo de exposição, calcula seu diafragma, comanda sua regulagem, posiciona seu foco, todas operações e muitas outras ainda - constitutivas do ato

da tomada e que culminam na derradeira decisão do disparo no “momento decisivo” (DUBOIS, 1994, p.85)



“Não há nada no mundo que não tenha um momento decisivo” (RETZ apud BRESSON, 1996, p.15). A citação do Cardeal de Retz está presente no capítulo intitulado “momento decisivo”, do livro" Imaginário Segundo a Natureza" de autoria do próprioCartier Bresson. Esta afirmação, por mais simples que seja, exprime a simplicidade que é a filosofia do momento decisivo. Em qualquer ação realizada existe um instante decisivo, seja uma partida de futebol, uma manifestação política ou até mesmo a simples tarefa de estender as roupas em um varal, o instante está lá, ele acontece durante uma ou mais vezes, resta ao fotógrafo estar preparado para capturar este momento.


Contudo, é importante ressaltar que o instante decisivo não aparece somente umaúnica vez durante u

m acontecimento. “Um evento é tão rico que dá-se voltas em torno dele enquanto se desenvolve” (BRESSON, 1996, p.17). No decorrer da situação acontecem vários momentos decisivos que devem ser registrados, o fotógrafo somente deve guardar seu equipamento quando o evento em pauta chegar ao fim.

Algumas vezes, a gente tem a impressão de que tirou a fotografia mais forte e, contudo, continua a fotografar, sem poder prever com certeza como o evento continuará a desenvolver-se. [...] é preciso ter certeza, durante o trabalho, de que não se deixou um buraco, que tudo se exprimiu, pois depois será tarde demais, não será possível retomar o acontecimento às avessas (BRESSON, 1996, p.18).

Vamos tomar como exemplo uma partida de futebol. Um evento como este é geralmente o preferido dos fotógrafos esportivos. Durante 90 minutos, 22 jogadores disputam um jogo de puro contato físico onde a todo instante acontecem lances de impacto, vibrações e até brigas. Pode-se dizer que o momento máximo em uma partida é o gol, é por ele que os jogadores vibram, se emocionam e extravasam sua alegria. No entanto, em um evento como este, o gol pode não ser o momento decisivo da partida. Em algumas situações existem casos marginais que se sobressaem à importância do resultado do jogo, como por exemplo, uma queda de arquibancada, alguma briga entre torcedores ou uma reação mais intensa de algum jogador dentro de campo. Como por exemplo, na final da Copa do Mundo de 2008. O jogador francês Zinedine Zidane, um dos melhores do mundo na época, atingiu com uma cabeçada seu adversário depois de ser provocado (foto 03). O fato marcou aquele jogo e somente um fotógrafo (entre cerca de 200 que cobriam a partida), o holandês Peter Schols, conseguiu capturar aquele instante decisivo. Outro exemplo clássico é do fotógrafo brasileiro Pedro Martinelli, que foi um dos poucos fotógrafos presentes no estádio a capturar a foto do goleiro Taffarel defendendo o pênalti cobrado por Massaro, na final da Copa do Mundo de 1994 (foto 04), e devido ao seu posicionamento e escolha de objetiva foi o único a capturar essa cena de frente.



Fotografar esportes não é uma tarefa fácil. Em quase todas modalidades, a ação ocorre de maneira muito rápida, quando você menos percebe ela acontece à sua frente, logo em seguida está a metros de distância. O fotógrafo tem que estar atento a todo instante de um jogo, pois a qualquer momento pode acontecer um gol, uma jogada importante ou uma cesta decisiva. Por isso que a concentração é uma das características mais importantes na hora de fotografar. “Fotógrafos esportivos são como atletas. Eles precisam da mira de um lançador de baseball, os reflexos de um armador de basquete, e da concentração de um jogador de tênis” (KOBRE, 2008, p.97).


Comparar um atleta a um fotógrafo pode parecer exagero inicialmente, no entanto existem muitas semelhanças entre estas duas partes. Para a realização de um bom trabalho no campo do fotojornalismo esportivo é necessário muito treino. Assim como um jogador de qualquer modalidade, o fotógrafo necessita de muita prática para conseguir um bom resultado no seu trabalho. Uma das melhores maneiras de exercitar a fotografia esportiva, é presenciar treinamentos das equipes em pauta. Geralmente é quando os atletas simulam situações de jogo e o fotógrafo pode trabalhar sem a pressão da cobertura de uma partida oficial. Como destaca o fotógrafo Ivo Gonzalez, que já cobriu quatro Olimpíadas e quatro Copas no Mundo em sua carreira.

[...] o fotógrafo precisa desenvolver certas habilidades para conseguir captar o momento exato de um jogo de tênis ou uma prova de natação, por exemplo, e esse momento exato é um dos elementos principais de uma boa fotografia de esportes. A foto feita no momento certo é um dos requisitos do trabalho do fotógrafo de esportes[...](GONZALEZ, 2010, p.22).

Outra semelhança entre jogador e fotógrafo é quanto ao posicionamento. Ao fotografar qualquer esporte, o posicionamento é chave para conseguir uma boa fotografia esportiva. Não existe regra a ser seguida, depende do gosto de cada profissional eleger o melhor lugar para fotografar. A maioria dos esportes são disputados em ginásios, arenas ou estádios. Nesses locais o fotógrafo quase sempre pode se movimentar por todo o campo de jogo, buscando sempre a posição ideal para capturar os melhores momentos de uma partida.



Outras duas características importantes que um profissional deve ter ao fotografar esportes são agilidade e reflexos rápidos. Isto se a intenção do fotógrafo é registrar aquele exato instante em que o jogador chutou a bola para marcar o gol, ou o segundo em que uma moto derrapou devido a uma curva mal feita ou até mesmo aquele momento único em que o atleta salta para a cesta da vitória. Enfim, para capturar esses momentos, o profissional precisa estar extremamente atento ao jogo em disputa e o essencial: ter rapidez nos movimentos e se antecipar à jogada. “A chave para se conseguir grandes fotografias de esportes é a antecipação. A antecipação requer prever não somente o que vai acontecer mas também onde vai acontecer. Você deve basear esta previsão no conhecimento do jogo, dos jogadores e dos treinadores” (KOBRE, 2008, p.113).

Existe um preceito entre os fotógrafos, e principalmente os de esportes de que: “se você viu a foto, você não a tem”. Em jogos disputados em alto nível, a velocidade com que as jogadas acontecem é muito grande. Quando o fotógrafo aperta o disparador, o sistema de espelhos sobe desobstruindo a entrada da luz pela lente para capturar a fotografia. Nesse instante em que o espelho está alto, o profissional não vê o que foi fotografado. Por isso, muitas vezes, na hora de visualizar as fotos, nos deparamos com momentos que não vimos acontecer. Com a velocidade das câmeras hoje em dia, podendo tirar mais de 12 fotos por segundo fica mais fácil capturar momentos decisivos em um evento esportivo. Porém, é importante salientar que não é a máquina que faz um bom fotógrafo esportivo. A qualidade do equipamento é um complemento à habilidade do profissional, que deve ter o domínio de todas as faculdades técnicas para realizar uma boa fotografia esportiva.


Mas o que faz uma foto de esporte ter boa qualidade? Como quase tudo na fotografia, não existe uma convenção que defina a qualidade de uma foto esportiva. No entanto, a demanda atual das redações e sites que publicam fotos de eventos esportivos é por aquelas imagens com o foco no local certo e que exprimam algum momento decisivo do acontecimento noticiado. “A importância da notícia no esporte geralmente envolve a captura de imagens em foco, com a ação congelada de jogadores suspensos no ar, disputando a bola” (KOBRE, 2008, p.102). Em algumas situações a representatividade da fotografia é mais importante do que a qualidade técnica da imagem. É o caso de uma foto feita nas finais do campeonato de basquete dos Estados Unidos, a NBA, em 1998. A série final estava em seu último jogo e partida estava sendo decidida nos segundo finais, quando no último segundo o jogador Michael Jordan arremessa para a vitória do seu time, o Chigago Bulls(foto 05). A imagem feita pelo profissional Fernando Medina está um pouco desfocada no jogador que arremessa e focada mais na torcida, mas sua composição, com o jogador, o cronometro e a apreensão dos torcedores exprime exatamente o momento decisivo da partida. Esportes em geral tendem a proporcionar belas imagens para fotógrafos. Disputas de bola acirradas, comemorações exaltadas e cenas de desolação com a derrota. São esses instantes que mais chamam a atenção do espectador, que esperam no dia seguinte ao evento abrir o jornal ou o site e encontrar aquela cena que represente a sua opinião sobre o jogo disputado. O momento decisivo na fotografia de esporte também passa por quem recebe a foto, pois é o receptor que irá identificar aquele momento decisivo na foto publicada. Por isso, fotógrafos esportivos (como outros profissionais), não podem nunca deixar de buscar o diferencial, o interessante, o emocional em suas fotografias.


Como já dito, a preparação é muito importante ao fotografar esportes. Além de estar preparado física, mental e tecnologicamente, o fotógrafo precisa se preparar intelectualmente. Conhecer o jogo que vai fotografar é essencial para obter um bom resultado na cobertura fotográfica. Alguns esportes mais populares, como futebol, vôlei e basquete, já têm suas regras e características conhecidas pelo senso comum. Mas ao fotografar uma modalidade desconhecida, o profissional deve sempre buscar informações para complementar a qualidade de sua imagem, o conhecimento prévio do assunto acaba agregando alguma qualidade no resultado final do trabalho. Um exemplo prático disto é saber quando um treinador está com seu cargo a perigo. No decorrer do jogo, se seu time estiver ganhando ou perdendo, este técnico esboçará alguma reação que ilustre ou seu alívio com a vitória, ou desespero com a derrota.


Cartier Bresson nunca fotografou um evento esportivo, ao menos não se tem registro de qualquer fotografia sua nesta área. Se ele tivesse a oportunidade de fotografar alguma modalidade com as câmeras de alta velocidade hoje em dia, certamente ele se renderia à tentação de deixar o dedo sobre o botão, na tentativa de capturar o melhor instante no jogo. Esportes de contato ou velocidade são disputados em uma série de movimentos rápidos que se desenvolvem de uma maneira fluente e empolgante, é ação pura. Às vezes, há um grande lance que se destaca entre todos os outros ocorridos na partida, e outras vezes nada acontece no jogo, nem ao menos um gol, ou grito de vitória. Quem joga o jogo são os jogadores, não os fotógrafos. É o atleta que está dentro de campo que decide quando dará um carrinho no adversário, quando chutará a bola, para que lado comemorará, se irá sorrir ou se irá chorar.


O fotógrafo se torna refém de todas essas ações do atleta. Na fotografia de esportes existe muito pouco espaço para compor uma imagem, na maioria das vezes ela brota à frente da lente do profissional. A ação se desenrola de uma maneira tão rápida. que é quase impossível pensar em enquadramento e regras de composição. O que o fotógrafo tem condições de fazer (e isto depende da atenção, qualidade e técnica do profissional) é jogar com alguns elementos que formam o quadro, como um goleiro desolado por levar o gol em um primeiro plano desfocado e o atacante comemorando ao fundo em foco, ou vice-versa. Na fotografia esportiva, como quase tudo na área da fotografia, não existe uma regra específica e absoluta que imponha alguma diretriz ao profissional que trabalha neste ramo. O momento decisivo no esporte ocorre antes do jogo começar, são as escolhas do profissional antes e durante o evento que influenciam diretamente a sua capacidade de capturar esses instantes únicos proporcionados pelo esporte. Como destaca o jornalista Nildo Teixeira no prefácio do livro "Fotografia de Esportes" de Ivo Gonzales:

A velocidade, a abertura e, especialmente o foco, devem ser resolvidos no "momento decisivo", a partir de uma leitura prévia de luz do ambiente onde acontece a competição. A expressão do atleta, a composição dos elementos, as regras básicas - aquelas mesmas que existem para serem quebradas - o enquadramento perfeito, enfim, a plasticidade da imagem final é pura intuição, observação, olhar - individualidades capazes de diferenciar um grande fotógrafo de esportes. (GONZALEZ, 2010, p.19)

O conhecimento do jogo, a prática sobre o assunto fotografado, a preparação para ir ao campo, a escolha das lentes, o posicionamento no gramado, a relação com colegas de trabalho, enfim, todos esses pontos já conhecidos ajudam e melhoram a qualidade do trabalho dentro do evento esportivo.



Henry Cartier Bresson pode não ter fotografado uma Olimpíada ou uma Copa do Mundo, no entanto sua filosofia está presente direta e indiretamente nesses eventos. São momentos decisivos que decidem um campeonato ou uma disputa de medalha de ouro, milésimos de segundo podem ocasionar os resultados mais adversos no esporte. O fotógrafo precisa trabalhar em cima deste tempo disponível para registrar o momento e transmitir para o mundo, em imagens, esse momento decisivo. Mesmo que a fotografia não esteja com todos seus elementos geométricos alinhados ou o profissional não tenha esperado por horas a ocasião certa de apertar o botão, a fotografia fala por si só, ela foi feita no momento certo. Hoje em dia os profissionais se utilizam do motor da câmera para registrar múltiplos quadros por segundo, e em apenas um deles, a foto ideal está presente. O fotógrafo esportivo se utiliza de todos recursos de sua máquina digital para registrar todo o evento, porém, dentre todas as imagens feitas, uma se destaca: a do momento decisivo da partida em disputa.




Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação Fortaleza, CE - 3 a 7/9/2012 - Pedro Revillion de Oliveira Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS

REFERÊNCIAS BARTHES, Roland. A câmara clara . Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.CARTIER-BRESSON. Henry. O imaginário segundo a natureza . Barcelona: EditorialGustavo Gili, 2004.COELHO, Paulo Vinícius. Jornalismo Esportivo , São Paulo: Contexto, 2003.DELPIRE. Robert. Henry Cartier-Bresson Fotógrafo . São Paulo: Cosacnaify, 2009.DUBOIS, Phillipe. O ato fotográfico . Campinas: Papirus, 1994.FONTCUBERTA, Joan. El beso de Judas . Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2002.GONZALEZ, Ivo. Fotografia de Esportes . Balneário Camburiú: Editora Photos, 2010.KEENE, Martin. Guia Profissional . Lisboa: Dinalivro, 2002.KOBRE, Kenneth. Photojournalism, the professionals approach . Oxford: Focal Press,2008.KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica . Cotia: Ateliê Editorial, 1999.SONTAG, Susan. Sobre fotografia . São Paulo: Companhia das Letras, 2004.SOUSA, Jorge Pedro. Uma história crítica do fotojornalismo ocidental . Chapecó: Grifos,2000. SOUSA, Jorge Pedro. Fotojornalismo : introdução à história, às técnicas e à linguagem dafotografia na imprensa. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2004

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